E nesta noite, ao lado da Lua, eu vi Júpiter. Pousei meus olhos sobre aqueles dois astros, sem pressa de desviar para outro lado. Meu corpo treme sentindo falta da droga mais poderosa. Meu coração aperta enquanto tento respirar. O ar entra com dificuldade, eu perdi meu presente de Natal. Como se não bastasse estar no fundo do poço, não quero mais aquilo que me acalmava, meus olhos estão encobertos pela lama. Eu quero a minha vida de volta, aquela que tiraram de mim aos poucos. Sinto vontade de chorar, mas não posso. Sinto vontade de rasgar meu peito para essa dor sair daqui de dentro, mas não consigo. Minhas mãos tremem na iminência do desespero, quero fugir mas não tenho pra onde, quero me esconder mas não há esconderijos. Por que você sumiu quando eu mais precisei? Por que é tão difícil falar da minha dor para os outros? Por que eu mantenho sempre esse sorriso no rosto se no fundo tudo desmoronou? Eu não sei falar da minha dor porque não quero deixar ninguém triste. Não estou chorando por ser fraca, mas porque fui forte demais durante muito tempo. Agora acabaram as minhas forças, virei um nada. Sou só mais uma, simplesmente mais uma entre os indigentes da grande cidade. Ficarei entre os marginalizados e excluídos, me juntarei àqueles que um dia ajudei. Quem vai me alcançar a mão e me mostrar um caminho? Minha amiga, você não imagina o quanto você está no lucro. Estás melhor que eu, com certeza. Vamos trocar? Vens de volta e eu vou no teu lugar.
terça-feira, 25 de dezembro de 2012
segunda-feira, 24 de dezembro de 2012
Pós Mortem
Nestas horas em que a madrugada vai passando lentamente, feio a água de um riacho, em que o tempo badala em meus ouvidos feito sinos, o barulho da rua só me lembra o imenso vazio que há aqui dentro, que me desanima e não me permite levantar da cama e aproveitar a vida lá fora. Não, eu não quero mais rua, não quero mais a noite, nem bebidas, nem cigarro, nem comida, nem água. Eu não quero nada. Quero ficar exatamente aqui enquanto vejo meu corpo murchar e desfalecer. Quando ele partiu, levou junto com ele todo meu ânimo, todas as minhas forças, todos os meus sonhos, levou meu mundo, levou quem eu era. E agora eu me vejo aqui, olhos vidrados no teto, um ventilador velho arejando o quarto, a cama com lençóis amarrotados. Nos armários não há comida. Nem sei há quanto tempo estou sem comer e exatamente na mesma posição. Foi naquele instante que meus pés perderam o chão e eu caí. Acho que estou em estado de choque. Ou em abstinência. De repente eu era viciada na adrenalina que, ao estar com ele, corria nas minhas veias. A iminência da morte me arrepiava. Como um paixão súbita e estranha, ele se tornou o ar que eu respirava. Em todos os dias, as 24 horas eram com ele. Nunca vivi emoções tão fortes antes, nunca senti o sangue correndo tão rápido, minha pele antes não corava, meus sorrisos eram amarelos e temerosos. Ele revolucionou meu mundo, me invadiu, me trouxe à vida, embora com ele eu a pudesse perder em qualquer momento. E quando ele partiu, antes disse: "será como se eu nunca tivesse existido". Mas não, as lembranças tão vivas na minha cabeça martelando todo tempo eram a maior prova de que ele tinha sido real. Esse buraco no meu peito, esse oco nos meus dias também. Não importa onde ele esteja, não importa o amanhã, eu não sei por onde recomeçar. Eu não sei fingir felicidade, eu não quero usar ninguém como estepe. Ele era único e insubstituível. Eu não sei o que fazer com os dias que ficaram cinzas e tristes sem a beleza daqueles olhos cor de mel. Não sei o que fazer com as horas que passam, não sei como lidar com o amanhã, nem com a vida fora desse túmulo. Enquanto ele não voltar, nem sei por quanto tempo ficarei assim. Meu tudo virou nada. Se isso não é morte, então o que é?
Natal
Pronto. A meia-noite já passou, todos os presentes abertos, todas as preces feitas, as luzes vão se apagando aos poucos. Da ceia, apenas restos. Da missa, as esperanças renovadas para uns e as mesmas incertezas para outros. Eu só quero que o ano termine bem, que o dia, se não for pedir muito, também. Que estes momentos perto de quem eu amo fiquem eternizados em meu coração, em minha memória, em minhas entranhas, porque a vida é muito frágil. Quisera eu que todos os lares tivessem todos os dias a alegria de hoje. Que todas as famílias brindassem todos os dias ao amor e à união; que pelo menos em todos os fins de semana estivessem reunidos e estourassem um champanhe. E que perto dessas datas não houvessem perdas, apenas ganhos e vitórias, para que os sorrisos fossem verdadeiros nesta celebração. Lágrimas? Só de alegria. Abraços? Os mais apertados. Olhares? Os mais sinceros. Amores? Só os eternos. E que nesses poucos dias que restam do ano que está terminando, possamos refletir sobre tudo que nele vivemos e nos preparar para o ano que está chegando. Feliz Natal.
Confinada
Estou fechando as portas e as janelas, cobrindo todas as entradas de luz e a mobília. Sei que tudo vai ficar trancado e fechado, sem vida, mas mesmo assim quero preservar as velharias longe do pó que vai se acumular com os dias. Estou indo para talvez não mais voltar. Fechando o coração, quem entrou, entrou, quem não entrou, não entra mais. Estou cansada de mim mesma, dos meus dramas diários, dessa vida que perdi o controle. Vou para onde eu seja só mais uma na multidão, estou me vendo de fora: cara fechada, sorrisos amarelos, abraços leves. Quero o isolamento emocional, não quero mais lágrimas. Tomei uma anestesia contra todos os males. A dor humana não me comove mais, o amor não existe, as pessoas só ficam perto umas das outras porque sempre há o que se oferecer e obter. Quero caminhar pelas ruas escuras e me misturar à escuridão. Quero passar despercebida, invisível aos olhos de todos, dando o mínimo de mim, aceitando uma vida sem ambições. Porque quem não sonha, não sofre e não se decepciona. Estou sentada dentro do meu casulo e vejo o mundo girando, girando, sem parar. A vida vai continuar lá fora, seguirão acontecendo crimes, mortes, catástrofes naturais, o futebol para encobrir isso tudo e dar um pouco de circo ao povo. Mas aqui dentro será diferente. Quero tudo estático como a água de um poço, não quero vendavais nem fortes emoções. Acabei de cobrir os espaços que faltavam: agora nada mais me atinge. Nada me toca. Aqui dentro CDs velhos e cigarro, um filme brega na televisão, sem internet e alguns livros para me distrair, cadernos para escrever. Um gato para quebrar o silêncio e uma boneca pra aliviar meu desejo de ser mãe. Comida congelada na geladeira, celular que não toca. Do trabalho para casa, de casa para o trabalho, num caminho fácil de não se perder. É como se eu estivesse morta, mas meu corpo seguisse andando e fazendo as coisas de forma automática. É isso, liguei o piloto automático. Não quero ninguém aqui, nada de pessoas efusivas, festas e barulho. Fechei minha vida para o mundo. E que tudo se acabe lá fora que eu não tô nem aí...
Um café e uma carta
Quando estiver com ele, não faça nada que você não vá fazer sempre. Não o iluda nos momentos em que estiverem juntos, não mostre apenas o seu melhor: apenas se mostre. Não o pressione. Não caia de cabeça. Deixe o tempo correr e as coisas acontecerem da forma mais natural possível. Não leve tão à sério e mesmo que esteja apaixonada, não demonstre. Seja você mesma, com seu ciúme sempre contido e com essa ânsia de se entregar, de explorar tudo do novo. Contenha-se. Fique na sua. Não deixe ele perceber que você está completamente caidinha. Seja fria e quente, ao mesmo tempo. De novo, não o pressione. Entenda que nem todos os homens são práticos: eles também tem medos e em geral eles não sabem o que querem. Não vai adiantar você ser uma mulher maravilhosa, se ele não tá afim, ele não tá e pronto. Você sabe que o tempo te ensinou a corrigir o que errou no passado e te transformou numa mulher incrível. Você sabe do que é capaz e do quanto é capaz de amar e se dedicar para fazer um homem feliz. Você é a parceira ideal, que anda por aí perdida e com os olhos sempre atentos esperando quem reconheça isso. Mas não tenha pressa, acalme seu coração. Nesta sua busca frenética vai acabar se atirando nos braços de quem não merece tudo que você tem pra oferecer, cuidado. Seu coração é frágil, cuide sempre para quem você vai entregá-lo para que não o quebrem de novo, porque você sabe que se isso acontecer não vai ter conserto. E quanto à ele, não perca seu tempo. Homens de verdade sabem o que querem e querem agora, não pensam muito, não. Relaxe, curta sua vida e a organize, busque um outro caminho, deixe-se ser encontrada por alguém que vai ver de longe que você é especial e diferente. Não procure mais, não se entregue mais, saia desses sites de relacionamento. Siga sua vida sozinha, encare a solidão como um aprendizado. Depois que você aprender a ser feliz sozinha, será o momento certo para encontrar quem vai realmente te transbordar de felicidade. Deixe os complicados para lá, porque você não é complicada e sabe o que quer. Você é uma grande mulher, uma mulher à moda antiga e merece no mínimo alguém que queira as mesmas coisas que você e na mesma intensidade. A cidade em que você mora tem mais de um milhão de habitantes e com certeza, entre estes, há de ter um que foi feito para você, como nos contos de fada que você insiste em acreditar. Reconheça o seu valor e dê-se mais e mais valor. Você é uma joia rara. Não merece o mínimo. O máximo te espera.
Assinado: sua melhor amiga.
Assinado: sua melhor amiga.
sábado, 22 de dezembro de 2012
Insônia
As horas seguem passando com um piscar de olhos e eu aqui, sem sono. Sem querer dormir para não sonhar.O soco na boca do estômago foi forte demais para que eu consiga dormir. Saber que não se é o bastante machuca. Descobri que eu não sou o bastante, embora esteja dando tudo de mim. Faltam-me as palavras para descrever o oco que ficou aqui dentro. As palavras até vem mas eu não as quero pronunciar, vou guardar toda dor num cantinho escondido da torre. Não hei de compartilhá-la com ninguém, afinal ela não tem razão de existir. Ela é apenas o fruto do que eu mesma plantei. Foi eu quem deu o primeiro passo, quem se atirou em queda livre, quem apostou todas as fichas muito antes de ter obtido todas as informações. Eu tive fé e a minha fé me traiu. De repente aqueles olhos não são os mesmos de outrora. De repente os acordes de guitarra cortam como um punhal. Falta a droga que cura. Falta uma bebida forte. Falta tudo. Os pés gelaram com o vento frio lá fora e o coração também. Me dê um uísque, uma vodka, acende o meu cigarro com fogo vívido, preciso me aquecer. Preciso recobrar os sentidos depois da queda porque ela foi enorme. Preciso que o ar entre... Quem sonha alto não pensa no tamanho do tombo.
Meu drama
Os sonhos não morreram. Nem a impulsividade. Comigo é tudo, absolutamente tudo, aos extremos. Tudo ou nada, o tempo todo e são raras as vezes que encontro o meio termo. Se gosto, gosto demais. Se não gosto, não gosto mesmo. E o tempo vai passando e usando isso contra mim, porque no amor me entrego rápido demais, como uma menina afoita, como na adolescência cheia de rebeldia e de regras quebradas. Sou madura nas ações, mas o esforço é enorme para controlar minhas emoções e não dizer um "eu te amo" nos primeiros dias de envolvimento. É difícil ser assim, porque a vida não pode ser vivida aos extremos. E sempre vai ter um abusador para usar minhas emoções e sobre elas fazer seu deleite. Por isso construí um muro ao meu redor, alto o suficiente para me proteger dos mal intencionados, um muro cercado de arame farpado e alarmes, mas os alarmes não soaram enquanto ele escalava. As mãos dele não se intimidaram com tantos espinhos e cacos de vidro. Ele pode ver que meu coração era um cristal e não hesitou diante de tantas armadilhas astutas. Ele queria o meu tesouro, tão valioso, tão escondido, mas que não escondi o suficiente: os olhos dele foram além das barreiras intransponíveis. E ele chegou ao topo mais rápido do que eu pude controlar, a escalada foi frenética e teve o auxílio dos cabelos da Rapunzel, que caíram, despropositadamente e contra a minha vontade. Ele era corajoso e eu estava desprevenida. Ele entrou, invadiu todos os espaços mostrando que eu estava viva e inteira, ilesa depois da maré ruim que me motivou a construir o muro. Os sonhos, a delicadeza, o romantismo tão natural: estava tudo esperando o destemido que transporia as barreiras. Agora ele está do lado de dentro e mesmo que por vezes não o queira ali, não posso expulsá-lo. Se ele não vai sair, que seja bem-vindo, que fique para sempre, que aceite tudo que tenho para oferecer. Que os dias sejam longos e que os sentimentos brotem verdadeiros e saudáveis, porque eu sei o quanto eles tem esperado quem os mereça. Eu sei o quanto são longos os segundos no alto desta torre em que me isolei, o quanto os dias demoram a passar e o quanto a espera é dolorosa. Minhas palavras ecoam vazias enquanto ele se fecha no silêncio e de repente o que era lindo, se torna escuro e sombrio. A penumbra venda meus olhos e eu já não sei por onde seguir, perco a linha tênue que me mantém sob controle. E tudo que eu queria agora era voltar no tempo e consertar tudo isso. Ou saltar pela janela da torre e voar... para onde não houvesse medo, nem incertezas, nem sentimentos. Queria a paz sofrida que existia aqui antes dele chegar. O começo de um amor nos desacomoda, traz alegria mas leva o sossego. É só uma possibilidade. Eu cairei quando ele partir. Só me avise quando eu estiver voando lá de cima.
Novidade
Era como se meus pés não tocassem mais o chão e eu literalmente estivesse flutuando, como nos sonhos que eu tenho em que saio caminhando e logo estou voando. Era como se ao meu redor o mundo fosse mais bonito e colorido, alegre, vivo e todas as pessoas sorrissem para mim e o próprio céu me olhasse aos risos. E de mim pareciam sair coraçõezinhos que se espalhavam ao meu redor, como bolhas de sabão. Não, eu não era a mesma pessoa de alguns dias atrás. Tudo tinha mudado gradativamente, conforme ia crescendo a aproximação entre os dois. A minha vontade era sair gritando mundo afora a alegria que veio fazer morada dentro do meu peito, que já não cabia em mim. Uma paixão linda estava no ar, iluminando tudo, limpando os espaços há tempos vazios, colocando em ordem toda bagunça deixada pelos desamores. Eu não queria denominar o que sentia mas não tinha outra forma de dizer: eu estava apaixonada e foi rápido demais, ainda que eu tivesse me controlado de todas as formas para evitar isso. Depois de algumas decepções ficamos tão temerosos e sentimos o medo nos arrepiando quando percebemos que o sentimento está começando. Natural que seja assim, natural querermos nos recolher do mundo quando somos magoados, manter distância de qualquer tipo de envolvimento. Acontece que não há como prever quando um novo amor irá chegar. E o novo transforma o que estava vazio e triste, limpa as feridas, ajuda na cicatrização, é remédio para qualquer dor. Nos pega desprevenidos, sem armas, sem proteção, entra e invade, toma conta de tudo. Então o que me restava? Viver cada segundo como se fosse o último porque essa com certeza é a melhor sensação do mundo... Uma mistura perfeita de curiosidade, medo, ansiedade, desejo... E que seja lindo e perfeito, que dure o tempo suficiente para que encontremos a verdadeira felicidade, se é que nesse momento, ela já não está presente.
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
Estranheza
Não, meus dedos não se cansam de escrever. Só uma canção e toda a inspiração do mundo vem a mim. Não sei ao certo do que quero falar. Já falei de amor e desamor, de encanto e desencanto, de dor e morte, de vida, já questionei o que existia para ser questionado. Algumas respostas encontrei, outras não. Eu quero falar mais, falar da revolta que me faz doer o peito, da saudade que nunca passou, das lembranças sempre tão vivas. Os assuntos se repetem feito aquele disco na vitrola que a gente só vai movimentando a agulha para tocar de novo e de novo. A madrugada já começou e eu continuo com esta ânsia de gritar rua afora, mar a dentro, garrafa a dentro. Sim, me dê todas as bebidas disponíveis nesse bar. Me deixe dormir na areia sozinha. Me deixa correr sem saber para onde. O sol vai nascer daqui a pouco e meus olhos não se fecham, mesmo que eu precise descansar. Os acordes da guitarra ainda soam alto em meus ouvidos e os gemidos se expressam, com dor. Mais uma palavra e eu perco a razão. Embarco no primeiro carro que parar e sumo daqui. Corro em direção aos seus braços e os espero abertos para me receber. Cansei da vida lá fora, quero ficar aqui dentro e confinada com você. Quero teu cheiro na minha pele se misturando com o meu, quero teus beijos longos e demorados, para fazer o mundo parar de girar. Quero teu corpo no meu, num encaixe perfeito. Quero o frio, quero você para me aquecer. Quero o silêncio. Quero acordar do teu lado e não ter hora para levantar. Quero reviver cada segundo, quero que seja para sempre. Mas isso não depende só de mim, depende do teu querer. De eu ser o bastante pra você. As palavras se formam sem sentido, você me tira de órbita. Me roube para você. Me mantenha encarcerada ao teu dispor. Me embale em teu peito para dormir em paz. Faça meus olhos se fecharem. Faça meu corpo tremer. Faça meu coração disparar. Faça a vida pulsar em mim. Fique e faça todos os dias valerem a pena. Fique, nem que seja amarrado, amordaçado, preso em mim, para sempre.
Tua vez passou
Sabe a liberdade de que você tanto quer gozar? Pois é, eu já me cansei dela. Cansei de noites vazias e sem sentido, que no final eu acabei abraçada no travesseiro ou em um corpo de homem qualquer por pura carência. E no outro dia? Mais vazio. Era hora de colocar a roupa, juntar minhas coisas e sumir rua afora. Tens dois caminhos a escolher: esta maldita liberdade que vai te cansar dentro de poucos meses ou a minha doce e sempre agradável companhia. As duas coisas pode até ser, desde que eu seja sempre a prioridade. Então deixa a música rolar no som do carro e a velocidade fazer meus cabelos voarem e você sabe para onde? Para longe de você. Para longe do teu passado que está sempre presente, longe dos teus medos e anseios e indecisões. Quero aquilo que seja concreto e palpável, que esteja do meu lado quando eu me sentir mais sozinha. Não me importo se a noite está passando e você não está comigo, só não me fale de um possível amanhã quando eu encontrar. De repente o encanto desceu pelo ralo junto com o sangue das minhas feridas. Elas vão curar mas o encanto depois de quebrado nunca mais será o mesmo. Chega de mendigar seu amor que é tão pouco perto do que eu tenho para dar, um tanto que você não merece. Fica com esta sua vidinha medíocre e sem objetivos, dentro do seu mundo tão pequeno. Se a liberdade é melhor do que eu, se eu não sou o bastante para você então eu é que não quero mais estar presente. Vou te dar minha ausência como tua dádiva merecida. E o meu romantismo jogo no lixo junto com cada momento mais que especial que vivemos. De repente a pergunta muda: não questiono mais se eu sou o bastante pra você, mas você será o bastante para mim? Será que fluímos na mesma intensidade? Será tocamos na mesma frequência? Não, eu sempre fui além porque eu sabia o que eu queria. Você não sabe, nem de mim, nem de si mesmo. Se da gaiola que te aprisionou você quer distância, não é perto de mim que vais ficar. Agora eu consigo ver com clareza: você era pouco, muito pouco para mim. E mais uma vez, por carência, acreditei que você era o cara. Agora eu vejo em que poço fundo me encontro: enredada em uma lama tão espessa e escura que nunca consigo enxergar através dela. Ela me cega e um pequeno gesto de gentileza se torna o que poderia ser amor. Um beijo se torna romance. Tudo tem uma intensidade muito maior do que na verdade tem. Eu tenho que me curar. E não adianta correr atrás, está decidido. Já parti faz tempo e você nem percebeu.
Encontro fatal
Pude sentir o sangue escorrendo quente das minhas mãos, tamanha era a força que eu tinha batido contra a parede. Minha raiva saía pelos meus poros, não pude controlar e antes que eu cometesse um crime então que eu me quebrasse em mil pedaços. Tratei de me recompor e voltar para a festa. Ele ainda estava lá, quando na verdade me disse que estaria em casa. E foi quando ele me viu ali, parada feito uma estátua e os olhos vidrados nele e na sua nova companhia. Ele sabia do que eu era capaz e não faria nada que despertasse meu ódio. Me olhou com os olhos estalados de pavor e falou alguma coisa no ouvido dela que a fez olhar para mim e depois sumir no meio da multidão. Ele ficou parado por alguns instantes, com certeza esperando eu correr até lá mas eu nada fiz, continuei ali, imóvel, dos olhos corriam as lágrimas contra a minha vontade, obviamente. Eu queria ser forte, mas por dentro sentia tudo desmoronar e a primeira coisa que tinha ido por água abaixo era minha confiança, aquela que eu tinha cegamente por ele. Foi quando ele deu o primeiro passo até mim e eu instintivamente dei um passo para trás. Virei as costas lutando para não correr até ele e o questionar e saí dali, entrei no primeiro táxi que passou e fui embora. Nenhuma atitude impulsiva, nenhum escândalo, nenhum crime. Deixei ele parado na calçada gritando meu nome. Meu telefone tocou tantas vezes naquele resto de noite que tive de desligá-lo para conseguir dormir. E o nome dele nunca mais foi dito pela minha boca. Quem trai a minha confiança não merece sequer que eu pronuncie seu nome.
Aquele que ilumina
Já faz parte de mim. Faz pouco tempo que você apareceu inesperadamente mas tudo que estamos vivendo é intenso demais que eu diria que faz anos que estamos juntos. Tudo está acontecendo de um jeito tão natural que chega a dar medo. Estamos fazendo tudo tão certo que me impressiono com a paciência que tenho tido para lidar com cada momento sem querer apressar as coisas. Não, eu não tenho pressa. Quero aproveitar cada segundo perto para te aprender, te sentir, te conhecer, te cheirar, beijar, tocar. Quero aproveitar cada segundo longe mas que ainda assim permanecemos perto, porque você já está do lado de dentro, dentro da minha vida, no brilho do meu sorriso, na luz do meu olhar que anda iluminado nestes últimos dias. Eu que andava tão perdida por aí, caindo em noitadas sem sentido, nos buracos mais profundos e escuros eu ia entrando cada vez mais. Estava perdida de mim, mas você chegou. Você chegou e foi me iluminando, abrindo as janelas e tirando todo entulho que eu tinha deixado jogado nos meus dias. Foi colocando as coisas em ordem. E quando meus lábios tocam os teus é como se o mundo parasse e nada mais existisse à nossa volta. Cada gesto de carinho são tão relevantes, como a mão que levanta quem está caído no caminho. Quando ouço os acordes das canções mais lindas é inevitável o sorriso, não contenho em mim mesma a alegria de ter você por perto... Foi como a cura para todas as feridas. É como se o passado não existisse, como se eu nunca tivesse sofrido antes. Que este sentimento nunca acabe. Que a tua presença nunca se torne ausência. Sim, existirão pedras no caminho mas sei que com calma iremos transpor cada uma e delas construiremos nosso castelo, aquele, encantado com a magia do "felizes para sempre". E se não for para sempre, que seja infinito enquanto dure, já dizia Vinícius de Moraes.
terça-feira, 20 de novembro de 2012
O jogo
Meus passos ainda são tortuosos e cambaleantes, embora em meu sangue não haja nenhum sinal de teor etílico. É como se a presença dele me embriagasse subitamente, com seu hálito de menta que sempre fala tão próximo do meu rosto, como se não existissem espaços vagos suficientes para nos mantermos à uma distância aceitável para uma conversa informal entre dois amigos. A pele levemente dourada pelo sol da primavera contrasta com seus dentes sempre tão brancos e impecavelmente cuidados, que não ousam se esconder sempre que me vêem e se expõem despropositadamente em largos sorrisos. Os olhos são castanhos, o que poderia ser plenamente comum, mas os olhos dele tem uma profundidade diferente, como se suas pupilas se dilatassem e contraíssem, conforme o corpo dele se aproxima e se afasta do meu. E a embriaguez que ele me causa, devido a esse conjunto de detalhes que para mim nunca são imperceptíveis, é admirável, pois não venho me considerando uma mulher que cai fácil em armadilhas, não ultimamente. Com o tempo e os tombos infinitos, as mulheres (ou pelo menos algumas delas) desenvolvem um jeito perspicaz de se auto-protegerem, em geral se escondendo atrás de máscaras, disfarçando suas reais intenções. Daí minha admiração por todas essas reações absurdas e enigmáticas que ele me causa, como se com ele nenhuma máscara parasse em meu rosto, nenhum tipo de disfarce fosse forte o suficiente para me proteger. E eu fico ali, em um quase estado de transe, com lábios mendigantes por um beijo, apenas um que fosse e acho que no instante em que isso acontecesse, eu perderia o chão. Sem fantasia, sem armas, entregue, nua e crua e, verdade seja dita, é como se ele entrasse em minha mente de forma tão voraz, capaz de desligar todos os meus mecanismos de defesa, me fazendo crer que, contra esses sentimentos não existem antídotos. E isso sempre acontece, todas as vezes que eu o encontro demoro para recobrar meu estado de sanidade mental. E ele, tão sedutor, certamente sabe de todo esse furor que me causa. O que ele não sabe é em que momento perderei a cabeça, e daí sim, veremos quem é a verdadeira FERA desta história toda.
terça-feira, 13 de novembro de 2012
Constatações
Quando chão falta aos meus pés, quando tudo está estremecendo, como num terremoto em que tudo está prestes a desmoronar, é só do seu sorriso que eu consigo lembrar. Neste momento em que eu só queria ter alguém por mim, pra me proteger, me segurar pois a queda é iminente, pra me dizer para que eu não me preocupe porque esse alguém está ali, do meu lado, é só seu rosto que eu consigo enxergar. Você era forte, me fazia forte, me dava a paz que eu tanto preciso. Você era cheio de vida, dotado de determinação, nada lhe segurava, sua ambição era quase desmedida. Você chegou exatamente onde quis, alcançou seus sonhos tão merecidos, mas nesta busca toda, você me deixou para trás. Se perdeu de mim, soltou minha mão no meio da multidão e hoje eu simplesmente não existo pra você. Hoje que eu me tornei aquela pessoa que você queria que eu fosse, independente, um mulherão, moderna, uma excelente profissional, conquistei meu espaço, adquiri o que é necessário, hoje que eu sou a mulher que você sonhava, não é ao meu lado que você está. Engraçado que, mesmo depois de tudo de ruim que aconteceu, as boas lembranças são sempre as que mais falam, as que soam mais alto. E quando meu mundo está prestes a vir ao chão e eu estou tão perto do fracasso, não consigo imaginar outra pessoa pra me segurar, a não ser você. Isso só evidencia que lá no fundo você ainda é o rei, aquele que fez morada e nunca perdeu seu trono, o único homem que realmente me teve em seus braços com uma entrega total e apaixonada. Você ainda está tão presente aqui dentro como quando me entreguei nos primeiros beijos, como quando desenhava corações com nossos nomes, como quando contava as horas pra te reencontrar. E mesmo que hoje você seja tudo que eu mais precisava, nem que fosse só um abraço, nem por decreto eu teria você. O destino te levou por outros caminhos, não tenho mais a permissão pra te procurar, os caminhos não são mais livres como antes. E mesmo que eu morra aqui, só querendo teu olhar, morrerei consciente de que meu sonho derradeiro nunca poderá se realizar.
domingo, 4 de novembro de 2012
Partidas
E de repente eu me vi ali, sentada, ou melhor, atirada no sofá, um copo de cerveja americana cheio e muitas latas vazias no chão, um cinzeiro derramando tocos de cigarro pra fora e eu finalizando o que seria a terceira carteira do dia, com mais um prego do caixão aceso, entre os dedos, na maior melancolia. Descobri que dentro de mim ainda moram os sonhos de menina, aqueles que eu pensei que tinham se perdido com o tempo em meio a tantas decepções. Mas o fato destes sonhos estarem tão vivos e acesos quanto antes me coloca numa posição de ter que concretiza-los por bem ou por mal, para me autorrealizar. Ter sonhos é ter motivação para viver, mas os meus só me deixam deprimida. Era bem mais fácil ontem, quando eu estava feliz e bem resolvida com a ideia de ser solteira para sempre e nunca ter filhos, pois eu acredito que o mundo esteja cheio demais. Meus sonhos me colocam na dependência de encontrar uma pessoa que queira as mesmas coisas que eu, construir um lar, uma nova família, me dar seu sobrenome e filhos lindos e bem criados, porque eu sei que os criarei muito bem. Estes malditos sonhos são tão românticos e à moda antiga que eu diria que são quase impossíveis de se realizarem. Fui preparada durante uma vida inteira para ser uma esposa exemplar, submissa, parceira, companheira, passiva, amante, apaixonada, mas não é isso que a sociedade moderna exige das mulheres de hoje. Ela exige exatamente aquilo que sou neste momento: uma mulher independente, profissional, que ama o que faz e recebe bem por isso, mora sozinha e só pensa em aproveitar a vida, fazer pós-graduação, mestrado, doutorado... Muitos farão chacotas e dirão que devo procurar um analista, quando eu disser que, no fundo, ser assim não me satisfaz, não me completa diante de minhas vontades mais profundas. Nasci para amar, como boa pisciana, aquelas mulheres em que a vida é o casamento. Mas não se fazem mais homens como antigamente. Os homens de hoje estão tão acostumados com a liberdade que não querem se prender à fidelidade exigida para que uma relação seja duradoura e estável. Esse tipo de coisa é considerada sem graça hoje em dia. E então, me peguei aqui, pensando sobre tudo isso e sem ter uma conclusão precisa, condenada talvez a uma vida de reflexão e de andar conforme as ondas, conforme a maré que a vida vai proporcionar e conviver com o que ela vai ou não trazer. Mas isso é pouco para mim, quero muito mais e este querer só me faz sofrer. No mais, estou indo embora baby, lá para os anos 20.
Sem julgamentos
E
então não me condene se eu falo sozinha, se eu brigo com o espelho ou se eu
tenho medo do silêncio e da completa escuridão. Fale no dia em que estiver na minha
pele e puder tomar as decisões por mim, talvez assim consiga apagar o cigarro
enquanto digito e jogar toda cerveja e a vodka no ralo, me tirando de uma vida
de possível alcoolismo futuro. Não dirija a palavra a mim se for pra dar
pitaco, eu mando na minha vida, você não paga as minhas contas, não está aqui
para afastar a solidão e apagar todas as memórias ruins que me rodeiam. Não
diga nada quando souber que eu ando pelas sarjetas, vivendo amores voláteis de
uma noite, afinal, foi você quem e jogou nesta neste inferno quando me virou as
costas naquela esquina. É isso, a razão de tudo, de todo este descontrole, de
toda sensação de estar perdida nasceu naquele dia em que você me expulsou da
sua vida, me deixando jogada às traças, sentada na janela do sétimo andar, com
as pernas balançando no ar. Mas eu sou uma medrosa e covarde, deveria ter
aprendido a voar naquela manhã enquanto o sol nascia, para que você carregasse
a culpa todinha das suas costas. E não foi o que eu fiz, fiquei parada na tua e
entregando tudo que você queria durante longos cinco anos e agora só não é
assim porque você não está por perto.
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
O dominador
Submissão total. Meu corpo pertence a ele. Meus desejos, meus pensamentos, meus instintos são dele. Ele tem a chave de todas as minhas fechaduras. Para ele abro todas as portas, abro minha mente, abro meu corpo e o entrego, como recompensa por tudo de bom que ele me faz. A entrega é completa, só ele tem a permissão para fazer o que bem quiser comigo. Amarrar, morder, apertar, apalpar, amordaçar, agredir, surrar, beijar, tocar. Apenas a ele eu me submeto. Eu obedeço suas ordens feito criada, sou objeto para sua livre manipulação. Eu pertenço a ele, sou dele e ele é meu DONO. Como ele diz: "sou teu macho e você é minha fêmea".
Necessito ser sempre dele.
Dependo inteiramente desse homem. Eu choro sem pena na cara dele, tentando mostrar o quanto o preciso o tempo todo, o quanto seus carinhos e sua rispidez são o ar que eu respiro, são o que me mantém. Comigo ele se sente mais homem, daqueles bem à moda antiga, pois eu deixo ele exercer todo seu poder sobre mim... O tempo passa depressa quando estamos juntos, ele sabe ser carinhoso e romântico quando necessário. Sou a mulher dele. Eu, a cordeira e ele o lobo mau. Sou Escrava. Serva.
quarta-feira, 17 de outubro de 2012
Sem lembranças
Já perdi as contas de quantas vezes perdi a memória e isso vem acontecendo frequentemente nos últimos meses. Perdi as contas de quantos perfumes usei na vida e do quanto cada um deles está ligado a tantas lembranças, umas até que eu queria esquecer para sempre. Falta-me memória para recordar coisas simples, como o que almocei ou o que vesti ontem, mas sobra memória para lembrar as feridas que não foram curadas, como um sinal de alerta de que eu preciso resolver determinadas situações. Como mexer em questões que não envolvem só a mim? Como chegar até quem interessa se eu nem sei o que está mal resolvido ou como resolver? Certas coisas, quanto mais mexemos, mais causam dor. Certas coisas tem que ficar enterradas, embora vivas. E não importa o quanto o seu inconsciente vai gritar, não importa quantas vezes você vai sonhar com isso, o tanto que vai pensar: é necessário que sejamos fortes o suficiente para conter o impulso do inconsciente e deixar o passado no passado. E não tocar, não mexer, na esperança de que tudo morra por sufocamento.
Opressão
Era
madrugada quando o telefone tocou. Ela acordou em sobressalto, assustada, não
sabia de onde vinha aquele som e demorou até conseguir abrir os olhos e
entender o que estava acontecendo. Correu até a sala, cambaleando, embriagada
pelo sono profundo em que se encontrava e quando atendeu, do outro lado da
linha tinha um homem sedento de atenção. Ele falava sem parar no quanto queria
e precisava vê-la naquele momento, do cansaço da viagem, que precisava do
cheiro dela, da pele, do toque. Ela hesitou por um momento, ao pensar nas
responsabilidades da manhã seguinte, do relógio que inevitavelmente despertaria
às 6 horas da manhã e ela não teria a chance sequer de dormir mais 5 minutos.
Mas dado o contexto de sono e fragilidade por ser acordada de forma tão brusca
e inconveniente, se considerássemos a forma peculiar que ela tinha de ser tão
permissiva com os homens, de colocar-se sempre à disposição, de pensar que
nasceu para cuidar e satisfazer um deles, aquele coração mole não permitiu que
da sua boca o “não” latente pudesse sair. Disse que aceitava recebê-lo, embora
nem todos os vizinhos estivessem dormindo e o apartamento bagunçado, malas pela
sala prontas para a viagem de quatro horas que lhe aguardava na noite seguinte.
Em menos de 15 minutos ele chegou, não hesitou e nem se importou com o
movimento alheio ao segurar seu corpo com força e calor. Pouca conversa e ação:
ele estava sedento pelo corpo dela, cheio de desejo, queria desfrutar dos
atributos e qualidades que só ela tinha. Ela saciou toda vontade dele,
revigorou a vontade dele de viver. Como numa visita de médico, ele se vestiu e
tratou de ir embora, afinal já estava muito tarde e ele também tinha
compromissos, com a desculpa de que ela tinha que dormir, embora ela não
tivesse dito nada. Ela nada falou, um beijo sem graça de despedida, bateu a
porta, acendeu um cigarro e passou as próximas horas insone, fumando desmedidamente, tentando lidar com a culpa que sente por lhe faltar amor
próprio, por ser tão flexível, colocar sempre os desejos do outro em primeiro
lugar e sendo levada a fazer tudo que seu homem quer. Adormeceu. Celular
desligado.
terça-feira, 9 de outubro de 2012
Perguntas sem respostas
Um vento louco e cortante bate no meu rosto na madrugada
fria de um triste inverno, num ano ímpar e peculiar. Se a vida é isso, não há um
motivo em viver, se do acaso viemos e para a cadeia alimentar entraremos, nós,
humanos que não tem predador, que maldito seja este acaso de merda que me fez
nascer. Não gosto das coisas que não fazem sentido, não gosto de não entender a
razão de tudo ser assim, não há amigos imaginários protetores dos desamparados,
não há o amanhã se eu não quiser. Se o que me faz feliz nunca está ao meu
alcance, que mal tem em abrir mão de tudo e não sair nunca mais da minha cama?
O que me obriga a viver uma vidinha medíocre, que vai desde porres homéricos e
hediondos até sexos animalescos e sem sentimento nenhum? Por que não somos
totalmente livres para buscar aquilo que nos completa, abala, causa tremor e
furor de tanta alegria? Não é coerência, concordância, motivo, razão. Sobram as
perguntas e faltam as respostas. Seres incompletos e questionadores que acordam
pela manhã e tomam seus cafés amargos e muitos comprimidos, trabalham, internet,
algumas risadas, muitas lágrimas e um vazio que raramente é preenchido. Então
meu filho, deixa a música tocar, fuma teu cigarro e apaga na pele pra sentir
que está vivo, que ainda sente alguma coisa, nem que seja dor. E cala a boca,
cessa o infindável questionário sobre o que é a vida, porque todas essas
questões não passam de vãs e vazias reflexões.
E os contos de fada?
E os contos de fada? Realmente não existem. |
São poucos os que têm a sorte de um amor tranquilo. Na maior
parte do tempo encontramos pessoas insatisfeitas que se contentam com o mínimo
que carinho e atenção, embarcando em uma relação que já começa fadada ao
fracasso: cai-se na rotina e a maior inimiga dos apaixonados bate à nossa porta
- a acomodação. Quando o único programa é sair para comer, quando acaba o
dinheiro, quando nos afastamos dos amigos, cometemos erros que só enterram o
pouco que se tem. Somos egoístas demais para fazer um relacionamento dar certo,
amargos o suficiente para não acreditar e tudo que é previsível é tedioso. Com
a convivência desenvolvemos maneiras de fugir de uma conversa difícil, maneiras
de convencer e irritar o outro, o sexo é sempre o mesmo. O ser humano gosta de
desafios e desafiar hoje é correr o risco de parecer “fazida” e difícil. O
jeito é dar adeus ao que nos frustra, abandonar o que não nos surpreende e
viver longe daquilo que nos prende. Nesse movimento de fugir das regras e optar
por uma vida solitária, o tempo que dedicávamos a uma relação sobra para nos
conhecermos melhor. Estar só é ter tempo de refletir tanto sobre isso que
acabamos perdendo as esperanças. Os contos de fada realmente não existem.
Eis a questão
E se, de repente, eu desistisse de tudo? Sem lágrimas nos
olhos, colocar o básico numa mochila, pegar uma carona e ir para qualquer
lugar. Banhos em postos de gasolina, lavar a louça por um prato de comida, ir
pegando uma carona atrás da outra e nunca saber onde vai parar. Viver uma vida
sem planos, sem obrigações, sem impostos e como diz a música: “sem lenço e sem
documento”. Experimentar o que o mundo tem a oferecer para quem realmente não
se enquadra nos estereótipos, quem desistiu de acreditar em dias melhores e
apenas vive, um dia atrás do outro, sem o dever de ser feliz. Viver à margem da
sociedade, literalmente. Quem sabe assim eu conheço todo o estado, o país, o
mundo? Quem sabe assim eu esqueço as dores que essa vidinha medíocre e
certinha, cumpridora da Lei, boa cidadã me trouxe? Quem sabe assim não
acontecerão mais frustrações pelos planos que não se realizam? Quanta gente boa
eu vou conhecer, quantos caminhos à percorrer? Vivendo a vida de uma forma
peculiar, parando em manchetes de jornais e televisão? Sem amores, sem dores,
sem paradeiro certo, sem residência fixa, sem saber e não ter a mínima ideia de
como serão amanhã... Quem sabe a ânsia de ser feliz se resume em uma palavra:
LIBERDADE?
sábado, 6 de outubro de 2012
Epitáfio
E no fim da madrugada
toda minha inspiração
no cigarro uma tragada
um alívio para o coração.
Pink Floyd na vitrola
e mais um gole de uísque
força que não se controla
antes que eu arrisque.
Se o mundo está assim
a culpa não é minha
ódio dentro de mim
e um frio corre na espinha.
Aqui jaz um coração
cansado de sofrer em vão
e no final desse verso
deixo toda desconsolação.
toda minha inspiração
no cigarro uma tragada
um alívio para o coração.
Pink Floyd na vitrola
e mais um gole de uísque
força que não se controla
antes que eu arrisque.
Se o mundo está assim
a culpa não é minha
ódio dentro de mim
e um frio corre na espinha.
Aqui jaz um coração
cansado de sofrer em vão
e no final desse verso
deixo toda desconsolação.
Uma noite trágica
A noite está fria, o drink praticamente virou em nada depois que o gelo derreteu, enquanto ela brinca, demoradamente, com os dedos na mesa sobre a água que escorreu do copo. O relógio no pulso parou, o bar está esvaziando e ela têm acendido um cigarro à cada cinco minutos nas últimas horas. O rímel borrou com as lágrimas que rolaram e que ela rapidamente secou: chorar é para os fracos e covardes. Ela não se permite chorar, ela não admite chorar, mas as lágrimas simplesmente não a obedecem mais. O combinado era se encontrar às nove, já passa das duas horas e muita gente entrou por aquela porta, menos quem ela esperava. Enquanto a raiva corrói o que lhe resta de educação, ela tenta decidir se enfia a mão na cara dele até sangrar ou se quebra todo o carro, que ele protege mais do que seu membro genital. O que causará mais dor? O que vai acabar com o ego dele? Pouco importa se ele vai odiá-la depois do barraco que vai acontecer, homem que tenta fazer ela de boba sempre se ferra. Os ponteiros no relógio não param, as pessoas riem e conversam, o garçom já limpou o cinzeiro umas três vezes e a comanda está cheia, tanto quanto ela está cheia dessa vida de mendiga, que se contenta com migalhas, com encontros que tem hora para começar e terminar, com tanta manipulação, insubordinação, ela está cansada dos sorrisos enferrujados que brotam em seu rosto enquanto sussurra um "sim" contendo o grito do "não". Ele fica bravo se ela não faz o que ele quer, se ela não dá o que ele sempre vem buscar, se ela pede só um pouco de romantismo em vez de tanta sacanagem. São quatro horas da manhã, ela levanta, se recompõe, pega a bolsa, paga a conta e vai embora, certa de que isso não vai continuar.
quarta-feira, 3 de outubro de 2012
A dor da ausência
Eu sinto sua falta muito mais do que você pode imaginar. Quando sento para descansar no fim de tarde, quanto sirvo o mate para tomar. Sinto falta das nossas conversas infindáveis, discutindo teorias ou qualquer outro assunto que surgisse. A gente sempre conversava bastante sobre tudo, menos sobre nós dois. Falar da nossa relação era um monólogo: eu sempre falava, você sempre ouvia. Eu cansava de falar, você cansava de ouvir, ficava angustiado, mas nunca agiu diferente, nunca se abriu de verdade. Sinto falta, também, do cuidado e carinho que você me dava quando estava preocupado comigo. Sinto falta da sua mão na minha ao caminhar pelas ruas; falta do seu peito para eu encostar a cabeça e dormir segura. Fazem falta nossos passeios, viagens, expedições na natureza; faz falta você brigando comigo e me chamando de fresca quando aparecia um inseto. Dói saber que agora eu não tenho quem chamar por apelidos carinhosos, diminutivos bobos que só os apaixonados entendem, que eu não tenho para quem dar todo carinho guardado, não há quem receba meus beijos, mordidas, abraços tão repentinos e desmedidos. Não divido a vida com ninguém, intimidade e liberdade para qualquer coisa não tenho mais. Os problemas eram minimizados quando você estava por perto, mas existem coisas que eu não sinto falta. Não tenho saudade do ciúme doentio, das fúrias que você tinha se eu pedia um favor (dirigir, por exemplo), das caras feias quando ia contrariado em algum lugar comigo (só para não me deixar ir sozinha); não sinto falta de quando você fugia, bravo, de alguma conversa importante, de quando não contava as coisas para mim e eu só ficava sabendo depois, da maneira legal que você agia com os amigos e do quanto se preservava quando eu estava junto. Mas todas as coisas que eu não sinto falta são ínfimas diante da importância que a sua presença tinha e tem para mim. Não sei dizer ao certo o que acabou com o nosso "nós dois", se foi o meu egoísmo exagerado ou a sua falta de abertura; se foi o ciúme ou a rotina; o distanciamento ou o quanto somos diferentes. Não sei dizer o que nos manteve junto tanto tempo, se foi amor ou amizade, carência ou imaturidade, acomodação ou sonhos à dois. Nunca pensei que fosse sentir tanto a tua falta, ainda mais das coisas bem simples, mão na mão, carinhos espontâneos, segurança. "De repente ser livre até me assusta, me ver sem você certas vezes me custa".
Homo Sapiens. Sapiens?
O mais complexo de todos os animais existentes sobre a face da terra, sem sombra de dúvidas, é o ser humano. Dito racional, portador do polegar opositor, dotado de memória e capaz de planejar e prever o futuro, em tese, deveriam seus atos serem os mais calculados e coerentes possíveis. Mas, contrariando todas as previsões e suposições, por vezes age de forma irreconhecível pelos seus semelhantes, totalmente descontrolado e fora de qualquer padrão. O homem é imprevisível. Embora todo este desenvolvimento, seus instintos animais nunca foram totalmente adormecidos. Gritam e agridem quando ameaçados, nunca perdem a vontade de reproduzir a espécie, correm diante de situações de perigo, tendem a guardar os alimentos para uma possível escassez. Conforme as leis do reino animal, o homem, por não possuir predador para sua espécie e ser ele mesmo o maior e mais temido predador da natureza, sua população cresceu desenfreadamente. Quando isto acontece, os animais irracionais param de se reproduzir e geralmente matam alguns membros com vistas ao controle do número populacional, para que o alimento não falte e a espécie venha a ser extinta. E o ser humano não foge a essa regra. O número de habitantes cresceu demais, dados os recursos naturais disponíveis para o nosso mantimento. Recursos estes que estão à beira do esgotamento. Matam uns aos outros perversamente como se, por instinto, estivessem querendo controlar o número de habitantes terrestres. Estamos à beira de uma catástrofe natural que acabará com a raça humana. Espero, sinceramente, que isto aconteça porque o egoísmo e a soberba cresceram demais. Já não temos dias de paz, vivemos acuados como animais presos em gaiolas, sempre correndo e desconfiados. Nesta selva louca, acordar em cada manhã é uma dádiva. E chegar em casa inteiro ao fim do dia também.
segunda-feira, 1 de outubro de 2012
A canção do meu erro
Eu achei que ele era um cara
legal, afinal de contas nos encontramos em uma madrugada fria, num momento
pós-festa de pura depressão e ele me falou as coisas mais interessantes que
ouvi nos últimos tempos, elogios teatrais que me fizeram acreditar que ele
estava falando a verdade (“Ela procurava um príncipe, ele procurava a próxima”).
Não, eu não estava bêbada, não posso usar isso como desculpa por ter caído
naquela conversa, mas a insistência foi tanta e eu não tinha nada a perder que
decidi encarar, cheia de ressalvas que ele sem hesitar aceitou, me deixando com
apenas uma opção que era aceitar seu convite para dormir no quarto dele, de
pijamas, só para conversar. Foi convincente demais, aceitou e acatou todas as minhas
exigências e nada pediu a não ser que continuássemos nosso papo que estava tão
legal em um lugar mais aconchegante, não poderíamos perder aquela oportunidade,
pois raramente se encontra alguém legal de verdade numa madrugada perambulando
por aí. Entrei no táxi, temerosa, trêmula e tão tímida que mal conseguia abrir
a boca para responder, mal conseguia dar continuidade na conversa. Na cabeça
mil coisas: medo, curiosidade, carência, vergonha, arrependimento. Fiquei
parada como uma estátua enquanto ele falava sem parar, tentando me deixar à
vontade e acabei cedendo ao cansaço e deitei, sucumbindo ao sono. Ele me beijou
(“Os lábios se tocaram ásperos, em beijos de tirar o fôlego”) e foi fantástico,
romântico, carinhoso, um verdadeiro gentleman respeitando todos os meus
limites. Fui me encantando e me soltando, conseguia sorrir enquanto
conversávamos nos escuro e de repente ele me interrompe e diz: “continua
falando porque eu quero apenas ouvir tua voz, ela é tão suave e sexy”. Falava
que eu era a primeira mulher a entrar ali e deitar na sua cama, depois do fim
de um longo relacionamento, pois eu era a única pessoa com um papo interessante
o suficiente para ele convidar a viver tamanha intimidade; contou sobre a
tempestade que enfrentou e do quanto já conseguiu se reerguer, enquanto
ouvíamos blues no rádio e aquela penumbra nos embriagava, ora de sono, ora de
desejo. E toda aquela paciência com todos os meus tiques e manias, minha
timidez típica que só desaparece se algumas doses estão correndo nas minhas
veias, ele me encantou e eu cedi aos nossos desejos e foi incrível (“ela
flutuava lépida, ele sucumbia ao pânico e ela descansava lívida”). Ele me levou
em casa feito um namoradinho dos tempos de escola, sempre tão cuidadoso em me
manter alegre e relaxada, ligou naquele domingo e nos dias que seguiram, nos
vimos de novo na semana seguinte e tudo estava indo bem (“o mundo redigiu-se
ínfimo, desenhou-se a história trágica”). Até que eu percebi que tudo não
passava de uma farsa para me conquistar, para conseguir o que ele queria. Eu
não me perdoei. Eu que sou uma mulher tão vivida, tão profissional, tão madura,
que me julgo conhecer os homens como à palma de minha mão, que me considero
expert em assuntos do coração, a conselheira das amigas que tem o coração
quebrado... Fui cair nas garras de um lobo ardiloso vestido em pele de cordeiro
e travestido de príncipe encantado (“ele enfim dormiu apático, na noite
segredosa e cálida”), mostrando-se como a solução para a minha solidão, que
tinha encontrado quem ele esperava e procurava... Onde foi que eu me perdi? Que
parte da história eu não entendi? Era só sexo então? (“ela despertou-se tímida,
feita do desejo a vítima”) Não precisava gastar o teu latim, poderia ter sido
bem direto embora eu entenda que não agiu desta forma por saber que eu não
cederia. Tudo bem que tenha me convencido a te acompanhar, mas chegando lá era
só me beijar, não precisava todo aquele clima, tantos elogios, telefonemas e
gentilezas (“amor em sua mente épico, transformado em jogo cínico”). Não se brinca
assim com o desconhecido. Não se brinca com os sentimentos de uma mulher. E eu
que já era desconfiada, agora fiquei muito pior. Obrigada por piorar a minha
frieza. Por me deixar mais incrédula nas pessoas. Por me fazer mais temerosa
diante dos homens.
“Pra ele uma transa típica, o
amor em seu formato mínimo
O corpo se expressando clínico,
da triste solidão a rubrica”.
Minha cruz
Caminhando pelas ruas escuras
numa madrugada fria, onde só minha sombra e o vapor da minha boca me
acompanham, eu conto os passos, eu chuto as pedras, eu conto os ladrilhos,
atravesso a rua sem olhar para os lados, entro nos bares mais porcos que
aparecem na quebrada de uma esquina. Não, hoje eu não quero cerveja, quero algo
mais forte, algo entre um uísque 12 anos ou uma tequila mexicana com muito sal
e limão. Pode trazer uma carteira de cigarros, aqueles do filtro amarelo, o
mais forte e venenoso que tiver para vender nesta espelunca. Quero observar
esses desocupados jogando sinuca ao longo da noite, cuidar quem entra e quem
sai, o quanto e o que bebem, quero ver a vida dos outros acontecendo para
esquecer o poço de lama que é a minha. O cinzeiro está cheio, lá se foram 20 cigarros,
quero mais e quando trouxeres aproveita e me traz um cinzeiro limpo, eu odeio o
cheiro que fica desses tocos apagados e amassados. Quero cuidar a porta, já
pensou se por um acaso louco do destino você estrasse por ela e dividisse esse
fim de noite comigo? Mas com certeza isso é impossível de acontecer, você está
há milhares de quilômetros daqui, dormindo numa cama quente e acompanhado de
quem ama, viciado numa rotina matrimonial que me cansa só de pensar, de
mercados, almoços, juntar calçados pela casa e dar umazinha bem mais ou menos
de vez em quando. Além disso, ninguém no mundo sabe onde eu estou agora, então
pouco importa o quanto estou bebendo e fumando, nem pra onde vou quando eu sair
daqui. Só quero encher a cara e destruir meus pulmões, numa morte lenta, curtindo
toda esta infelicidade, esta vida antissocial, isolada dentro de mim mesma, que
conversa com o nada, até com uma árvore ou um cachorro porque as pessoas me
cansam. Quem sabe um dia eu te reencontre para sentir aquelas borboletas na
barriga que sentia quando te via, para ver meus olhos brilhando daquele jeito
único e marcante, me pegar sorrindo de verdade de novo. Queria te encontrar
agora, não por ti (como boa egoísta que sou), mas por quem eu era e fui quando
você dividia uma bebida como essa comigo. Uma bela jovem, cheia de vida, de
sonhos, completamente apaixonada e confiante de que tinha encontrado o amor da
minha vida. Quero me sentir de novo assim, aquela reciprocidade que nunca mais
senti, a segurança e o aconchego que só conheci nos teus braços. Quero voltar a
ser quem eu era, tão diferente do que sou hoje. Envelheci uns 15 anos desde que
você se foi, penso como uma senhora idosa que só espera a morte porque não
acredita que a vida seja boa. Sim, e fico tentando apressar essa hora como
posso, tomando porres hediondos, fumando tudo que é porcaria, aceitando
qualquer proposta, fingindo que não sinto nada, pegando frio, chuva, sol e
qualquer homem que me queira, sexo pelo sexo, prazer por prazer, depois mandar
a merda e enxotar da minha vida. Tanto faz quem eu sou agora, que merda de vida
que eu vivo. Já estou cheia disso, meu discurso nunca muda porque a ferida
continua aberta e eu não aguento mais, não suporto essa ladainha, esses mesmos
lamentos há anos, esta mesma raiva há tanto tempo, todos os dias tudo sempre
igual. Às vezes parece que acabou, mas quando vejo uma estrela cadente no céu
e, por superstição, faço um pedido, é sempre teu nome que me vem à cabeça. Você
é a minha cruz, minha maior perda, símbolo da minha derrota, uma dor que parece
que não vai ter fim. Será que um dia isso vai curar de verdade?
Só uma curiosidade
Sim, sou alguém que traz muitos
arrependimentos dentro de mim. Fiz tudo errado, diversas vezes e sempre tive a
curiosidade de saber onde eu estaria e quem eu seria se eu tivesse tomado
decisões diferentes. Existiram momentos em que a decisão que eu tomei me trouxe
para onde eu estou hoje, mas em todas elas eu tinha outra opção. E se eu
tivesse escolhido o outro caminho? Se tivesse ouvido os conselhos que tanto e
reiteradamente me deram? Talvez hoje eu não estaria à mercê da solidão,
desilusão, frieza, desencanto, desamor. Mas não adianta chorar pelo que já
passou, ainda não inventaram uma máquina do tempo que nos proporcionasse apenas
uma chance de voltar atrás e fazer as coisas diferentes. Cada escolha, uma
consequência. Cada escolha, uma renúncia. Renunciamos algo em detrimento de
outra opção e não me falta curiosidade de saber como eu estaria se eu tivesse
escolhido o caminho que deixei para trás, há algum tempo. Eu pagaria pra saber.
Pagaria para poder optar novamente. Mas todas estas possibilidades não tem a
mínima chance de acontecer e enquanto meus olhos estiverem no passado, o
presente fica desassistido, não cuido do agora, muito menos do amanhã que pode
ser um futuro melhor do que hoje, ou não.
E se a vida de repente acabasse?
E se a vida de repente acabasse?
Como num relógio que acaba a pilha e os ponteiros param de andar? Ou como num
carro que acaba o combustível e ele simplesmente para, não importa o quanto
você esteja apressado? Se a minha vida acabasse agora, ficariam os boletos e as
encomendas que ainda não chegaram enchendo minha caixa de correio. Ficaria o
sonho de fazer outra faculdade esquecido. Os filhos que eu tanto quero ter, o
sonho de entrar na igreja toda de branco, o sonho de ter uma vida que eu
costumo chamar de “medíocre”- tudo parado no tempo. Quem sabe até “o cara”,
aquele que eu estou esperando a vida inteira para viver ao meu lado, nem
chegasse a me conhecer. E daí ele teria que bolar outro plano, achar outra
parecida comigo para não ficar sozinho. Minha mesa no trabalho ficaria vazia,
mas meu lugar logo seria preenchido porque tem muitas profissionais esperando
para pegar o meu lugar. As roupas e calçados novos ficariam me esperando para viverem
muitas coisas juntos, guardados em caixas e cabides, entristecidos por não
terem completado o fim a que vieram neste mundo. Perfumes, cremes, shampoos
pela metade, ainda com meu cheiro, com minhas marcas. Cremes que envelhecem em
seus frascos por eu nunca ter tempo ou ânimo de usá-los, a menos que eu vá
encontrar alguém importante que vá cheirar minha pele. Todas as minhas coisas
passariam a ter novos donos, provavelmente pessoas queridas que estivessem
tristes com minha ausência, mas minimamente confortadas por poderem ficar com algo
que era meu. Objetos que um dia ou todos os dias vão olhar e lembrar-se de mim.
Sei que muitos sentirão demais a minha falta, mas os dias inexoravelmente
passarão, a dor vai dando lugar a saudade e esta saudade vai passando, pois a
vida de cada um teria que continuar. E assim somos: simples animais que do nada
vieram e para o nada voltarão. Somos obras de um acaso, que uniu um óvulo e um
espermatozoide e por estarmos vivos temos que tornar os dias aqui os melhores
possíveis. Em um triste momento esta máquina vai parar e entramos novamente na
cadeia alimentar, não como predadores, desta vez somos como presas, servindo de
alimento para outros. A morte é só um coração que para de bater, mas acaba com
muitos corações que ficam. E a vida é mais frágil do que um cristal.
sexta-feira, 28 de setembro de 2012
Revendo prioridades
Eu disse que a gente precisava parar. Eu falei para respirar. Nós subestimamos o nosso corpo todos os dias por medo de que pensem que somos preguiçosos que não querem ter uma vida ativa. Perdemos o controle e por mais que tenhamos conseguido controlar o lado emocional, suportando tudo, o corpo a gente não controla. Nossa natureza disparou todos os alarmes indicando que, se não pararmos neste exato momento, o estrago vai ser muito grande, talvez até irreversível. Não somos máquinas e mesmo que fôssemos, todas elas em um determinado momento param com suas atividades para fazer manutenção. O mundo buzina em nossos ouvidos a todo momento nos convidando para entrar nesta maré de correria, trânsito, cheques, 15 minutos de almoço, ônibus lotado, trabalho 12 horas por dia, lazer quase nunca, sonos pela metade. Nos convida a viver uma vida que, para satisfazer todos os compromissos e cuidar de tudo, seria necessário que o dia tivesse 50 horas - ou mais. Logo, se você não parou por bem, mais cedo ou mais tarde vai parar por mal. De repente todas as teorias de meditação e Yoga começam a fazer sentido. De repente percebemos que não adianta nada viver uma vida maluca para ter um bom salário no fim do mês, se vamos gastar parte dele em remédios e consultas médicas. De repente percebemos que nossas prioridades estão completamente invertidas. Vemos amizades se esfacelando por falta de convívio, ficamos tão atolados em nossos afazeres que fazer um simples telefonema passa despercebido - "o mato cresce rápido em caminhos pouco percorridos". E neste ritmo, quando percebemos, estamos distantes de todos os amigos, nos afastamos familiares, pessoas queridas morreram e só resta a culpa por não termos feito uma última visita, tomado um último chopp, curtido uma tarde recontando histórias e dando risada. Parar, pensar, relaxar, respirar. Saúde, família e amigos sempre em primeiro lugar.
quarta-feira, 26 de setembro de 2012
Um lugar chamado Solidão
A casa caiu e ninguém vai te segurar, chegou a hora de você experimentar o sabor amargo da solidão, todos tem a sua hora e não é fácil chegar no seu apartamento depois de um dia de trabalho e não ter com quem conversar, para quem contar os momentos tensos e as alegrias. Todos já se foram, tem seus interesses, cada um tem mais com o que se preocupar do que pegar o telefone e te ligar. Não há recados na secretária eletrônica, o celular não toca, sem e-mails ou mensagens. Ninguém vai se importar se você desaparecer, se de repente resolver ficar três dias trancado dentro do seu apartamento, sem banho, sem maquiagem, sem comer, só bebendo e vendo TV feito um chapado. Na geladeira só comida congelada, bebidas e leite. Você não vai querer cozinhar porque fazer isso apenas para si próprio e não ter alguém para dizer o quanto a refeição está boa não tem graça; ninguém para reclamar da bagunça e da sujeira então você só vai querer limpar quando estiver inspirado. Você nunca está esperando aquele alguém especial chegar então pouco importa se o lixo e o cinzeiro estão transbordando, se a pia está cheia de louça e há copos, calçados, roupas, bolsas, jóias por todo lado. Você aprende a enfrentar seus medos porque não há quem te defenda e proteja. É só você e o silêncio. Uma cama enorme vazia, sem briga para escolher o canal na TV, os lugares na mesa e no sofá vazios então que diferença faz se você vai sentar ali ou aqui? Sem ter com quem conversar, você vai se acostumando a guardar tudo dentro de si mesmo e falar começa a se tornar algo complicado de se fazer: há tanto a ser dito, mas você desaprendeu, por força do hábito. O peito incha e dói porque o ser humano precisa trocar - não nasceu para viver só - e como qualquer animal, precisa viver em bandos. Ou ao menos em dupla. Um ser humano sozinho é uma brasa fora do braseiro: se apaga. Uma flor fora do buquê: murcha e morre. A solidão nos endurece. Esfria. Isola.
E mata lentamente.
Pare, por favor
Vejo a vida passando como um rio que corre para o mar, amigos e amigas casando, amores indo embora, filhos, gente partindo e chegando a todo momento. O mundo é uma máquina que nunca para porque o tempo nunca para e eu não sei até que ponto isso é bom porque ele passa tão rápido que não conseguimos observar direito as coisas, entender o que acontece, respirar um pouco. Vivemos dias tão corridos e rotineiros e geralmente não percebemos o que nos falta, o que nos cerca, o que nos faz bem, o que nos desagrada, mal sabemos quem somos. A memória vai ficando falha porque não vivemos com intensidade, nada fica marcado e o espaço do inesquecível vai ficando vazio, só restando algumas poucas memórias da infância e juventude que era quando não haviam tantas preocupações e a gente conseguia aproveitar melhor os momentos. Se o tempo não para, então eu paro. Deixar a vida correndo lá fora, o juro correndo no banco, as contas se acumulando, a comida na geladeira estragando, a cerveja amornando. Quero sentar na areia, sentir o cheiro do mar, ouvir as ondas e, sem pensar no relógio, olhar o infinito. Me ver no horizonte, rever prioridades, organizar a cabeça, respirar fundo, sentir o ar entrar e sair lentamente... a pele arder com o sol, a chuva misturar-se com minhas lágrimas, sim, eu preciso chorar, deixar a dor sair, o desamor, as perdas, as ausências, o stress do dia a dia. O choro fortalece os pulmões, alivia a alma, não cura mas ameniza. É disso que eu e mais meio mundo precisa. Parar.
Minha Chapeuzinho Vermelho
E parece que foi ontem que nossa amizade começou. Duas adolescentes conhecendo o mundo, a vida, experimentando, sempre com um sorriso no rosto, tentando aproveitar tudo o que nos era oferecido. Tua amizade me ajudou a enxergar um mundo que estava ali me esperando e que eu me recusava a conhecer. Me fez sair da casca, do meu canto, me desacomodou. A tua alegria me fez despertar e cair na vida real. Viver uma juventude plenamente, como tem que ser, com risadas, frescuras, festas, bebedeiras, conversas, presentes, filmes, beijos na boca, paqueras, parceria para toda e qualquer travessura. Brigamos, nos reconciliamos, fomos a shows nacionais, choramos juntas. Várias vezes. Dançamos muito. Passeamos muito. Estar com você era esquecer das tempestades, de todos os problemas, dos fracassos, do chefe, da segunda-feira, da igreja, do que julgavam ser pecado. Eu vivia acorrentada em teorias vazias e atormentada pelo medo. Você abriu o cadeado e, com certo esforço, me libertei. É como se eu vivesse numa sala toda trancada e você abriu a janela: pude ver o colorido das flores, a luz do sol, a noite, a alegria desmedida. Esqueci quem não me amava, curei a depressão. Depois mudei para longe, longe, atrás de um sonho e quando ele se realizou lá estava você pra comemorar comigo. A distância nos afastou mas não foi capaz de acabar com uma amizade linda... Sorrimos tanto juntas, aproveitamos cada segundo daquela comemoração. Mas daí a vida nos pregou uma peça. Uma peça triste e tão dolorosa. Você bateu as asas e voou, num voo tranquilo, um voo de paz, surpreendeu a todos mais uma vez. Partiu desse mundo terreno, deixando-o mais triste sem o teu sorriso, sem a tua alegria de viver e da sensatez dos teus conselhos, do carinho do teu cuidado. Dormiu como a Cinderela. Deixou saudade e muitas lembranças, tão doces de serem recordadas que quando lembro é impossível não brotar um sorriso no meu rosto. Fica, também, uma pontinha de esperança de que um dia a gente possa se encontrar de novo. Agora, dorme em paz, minha Polentinha, Nine, Pô, Polenta, Chapeuzinho Vermelho, minha eterna amiga Poline.
terça-feira, 25 de setembro de 2012
Uma palhaça no seu carnaval
Os dias inevitavelmente foram passando, o relógio não parou de andar, o sol não deixou de nascer e se pôr, veio chuva, lua cheia, lua nova, temporais. Vieram outros carnavais, natais, aniversários, trocaram o presidente, o governador, enchentes, secas, nascimentos e mortes. Bocas diferentes foram beijadas, rolaram transas com outras pessoas, muito álcool, novos amigos, novos lugares, brigas, acidentes de trânsito, formatura. A cada dia um passo para longe. O telefone tocou, você veio e se foi várias vezes, eu driblei tudo pra te ter de novo em todas as vezes que você quis, dei tudo de mim, cartas, palavras, voz trêmula, carinho. Num dia eu era tudo, era tua saída, a solução para os teus problemas, a mulher que você sempre amou, a mulher da sua vida, quem você quis esquecer e não conseguiu, o melhor beijo, o melhor sexo. No dia seguinte eu era apenas uma amiga, que nunca mais ficaríamos juntos, que um "nós dois" nunca mais aconteceria, que não teria volta, que eu não te procurasse mais, que aquela era a última vez que eu te veria. E o ritual se repetia: eu chorava, não te ligava, sentia ódio, caía na gandaia, bebia todas e achava que tinha te esquecido. Até virar a esquina e me dar de cara com você, vacilar em todas as minhas decisões e te aceitar de volta. E o ciclo nunca era cortado. Nunca foi cortado. Não importa se hoje uma longa distância nos separa, se eu quase esqueci teu telefone, se muitos dos nossos momentos foram apagados, todas as recordações colocadas no lixo, se faz meses que não nos falamos e nesse tempo todo você noivou, casou, mudou de vida, religião e hábitos. Quando eu vejo seu rosto nas fotos eu sei que você não é feliz, não está feliz. Falta um brilho no teu sorriso, uma luz que eu sempre vi brilhar nos teus olhos. Não importa se eu fui uma palhaça no seu carnaval, ainda conheço você, sonho com você, não faço cerimônia não. A quem você quer enganar?
O tempo é passageiro e vai dobrar teus joelhos.
Fundo do poço
Não me pergunte como eu vim parar aqui nesta noite fria,
usando apenas um sobretudo, vestido curto e uma bota, batom vermelho nos lábios
e um rímel borrado. Não importa se eu peguei um táxi ou uma carona de alguém
que achou minhas pernas bonitas e me convidou para entrar no carro. Eu não
sinto frio, nem fome, nem sono. Eu não sinto nada. Não me pergunte o porquê do meu coração estar
partido e tudo que eu consigo e quero ver na minha frente é um copo de uísque
sem gelo, ou uma vodka, ou qualquer outra bebida forte que faça com que eu
perca a cabeça, caia no chão e vá parar em qualquer lugar. Sim, é isto mesmo
que eu vim buscar neste bar repleto de homens que me olham inescrupulosamente:
um pouco de álcool, um tempo pra pensar, uma poltrona confortável, um cinzeiro
e muitos cigarros, um blues tocando sem parar, pois quando eu ouço um som
desses penso em ocupar rapidinho o espaço que ele deixou vazio. Ele partiu da
minha vida como se eu não fosse nada, fosse um móvel velho que ele jogou na
calçada e adeus, ou como um cachorro que ele largou na rua, ou um livro velho
que ele já leu e conhece todas as páginas e não se importa com o final. Para
ele tão simples e para mim tão complicado. Quero mais é encher a cara, fazer
desta maré ruim minha nova morada, sem sair deste lugar: quero é sofrer,
chorar, cuspir toda a dor que sinto de todas as formas que conheço de autodestruição.
Vou subir na mesa e dançar para todos os homens que me quiserem, entregar meu
corpo para o primeiro que passar, entrar em qualquer carro que me pegar, dormir
em qualquer cama que me oferecerem e até na sarjeta. Quando sofremos uma recusa
de alguém que amamos é como se nós mesmos nos recusássemos. Então pouco importa
que mão imunda vá te tocar, que boca você vai beijar e para quem vai se
entregar. Pouco importa se vai acordar amanhã, onde vai acordar, onde dormiu, o
quanto de álcool você tomou. Essa fossa dura o tempo que for necessário para
você entender que quem perdeu não foi você, mas quem não te quis. E se não te
quis foi porque não te merecia.
segunda-feira, 24 de setembro de 2012
Assassinato
Não peça que eu sorria, se tu me fizestes chorar. Se tu fostes o único e maldito motivo de tantas e tantas lágrimas! O meu rosto está cansado, sim, envelheci 15 anos nos últimos 6. Me tornei uma senhora mal amada, desiludida, sem esperanças. Tu tiraste o melhor de mim: minha vontade de viver, de ser feliz, de amar e ser amada, de ter uma família, ser mãe. Pegaste todos os meus sonhos cultivados da infância até a adolescência e jogou no lixo. Não sobrou nada além de frieza, desamor, desesperança. Não acredito mais em deus, não quero mais casar, ser mãe nem pensar, romantismo não existe, todos os homens são infiéis, o amor não existe, o bem não existe, o mundo está repleto de gente egoísta, sexo só os casuais e nunca mais. Das drogas as mais pesadas, porres fenomenais, a moça ingênua e sonhadora deu espaço à uma louca que não se intimida com nada. Zero de sentimentos. Nunca mais se apegar, nunca mais se entregar, nunca mais sonhar. Casamento? Só se for o dos outros, para eu destruir. Filhos? Só se for o dos outros para eu ensinar todos os palavrões possíveis e imagináveis. Tu que mataste a boa moça que existia em mim.
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