sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Diálogo inventado, monólogo

Hoje eu só queria conversar contigo, olhar em teus olhos mais uma vez sem a menor pretensão de querer te beijar ou afagar teu rosto, ou sentir entre meus dedos teus finos cabelos sempre arrepiados e difíceis de arrumar, muito menos sentir teu abraço ou sentar no teu colo como naquele último feriado que passamos juntos. Hoje eu queria saber como tu estás, conhecer o homem que tu te tornaste e, se pudesse, saber se ainda tem um pouco daquele menino que eu conheci há tanto tempo, com olhos febris e temperamento louco, que não hesitava em empinar um litro de uísque ouvindo uma música bem melosa. Queria saber o que pensa desse país que caminha de mal a pior, como é viver no teu estado e tão longe da família, como é ser pai. Na verdade, por ora, me contentaria em ser uma assombração e ver teu dia-a-dia, tua casa, conhecer tua esposa e poder pegar tuas filhas no colo, tão lindas, tão pequenas, tão frágeis, mas que tenho um carinho tão grande por elas como se fossem da minha família. Queria relembrar contigo nossas loucuras, dos milhares de porres que tomamos juntos, da vida social que eu tinha contigo, da alegria que tu aparentavas ter e que depois disse pra mim o quanto sofria por baixo dos panos. Me contentaria em dividir um café, numa tarde chuvosa, num barzinho isolado e te contar do quanto eu penso em ti todos os dias, num desejo inconsciente de te ver feliz. Mas principalmente, queria saber se, por acaso ou desengano, se em algum momento, tu pensas em mim...


Sonhei com você

Ah, que inconsciente cruel! Aquela ferida que a vida me fez, tão dolorida, que quando estava adormecida, eis que sonho com aquela alma que tanto amei, relembrando de tudo outra vez, do cheiro do cabelo, da textura da pele, quase sentindo outra vez a aspereza da barba crescendo, os olhos enigmáticos e frios de sempre; sim, aquele ser que me fez descobrir o amor, o doce sabor de ser amada e que depois me fez conhecer a mais profunda dor, a dor de perder alguém para a vida, de ora tê-lo, ora não tê-lo, num vai e vem sem fim durante anos, até que um dia ele embarcou em um avião e se foi...pousou seu coração em outro ninho e por lá ficou, construiu uma família e hoje deve ser feliz como nunca pude ser capaz de fazê-lo... E eu segui a minha vida, me refiz, tratei de buscar novos sonhos, encontrei um paradeiro, mesmo depois de vagar feito alma penada por aí... considerei essa ferida curada, um assunto morto e enterrado, ainda que meu coração as vezes teime em dizer que o futuro a Deus pertence, como aquele homem uma vez me disse, ainda que lá no fundo arda uma esperança de reviver aquele amor quase infantil e fabuloso... e então eu sonho com tudo! Acordo como se o tivesse visto ontem, ainda sentindo a dor de outrora, a saudade que nunca teve fim, a inveja por ele estar tão bem longe de mim... e percebo que depois de tudo me perdi, não sei quem sou, não sei o que eu quero, tenho medo do futuro... ele foi um vendaval que me fez perder o norte... hoje me contento com o que a vida me deu, uma vida mediana, pacata... mas sei que lá no fundo eu posso muito mais, eu poderia ir muito além... serei uma eterna inconformada com os meus dias, mas alguém que não sabe o que fazer para mudar!