domingo, 22 de maio de 2016

Facada

Bastou um esbarrão sem querer, numa noite quente de abril de 2007, para que aquele cara único entrasse na minha vida. Foram tantos encontros e desencontros, tantas histórias loucas, beijos na chuva, amassos quentes no elevador, mãos trêmulas ao me tocar que, quando me dei por conta já tinham se passado nove anos. Sonhei em completar dez anos de uma relação indefinida, que nunca foi namoro, talvez uma amizade colorida. Mudamos muito nesses anos todos. Moramos longe demais um do outro, mas quando perto, por alguma razão a vida nunca quis nos aproximar demais. Talvez porque nossos gênios tinham uma incompatibilidade incrível de se explicar. Talvez porque ele fosse tão cabeça dura. Talvez porque eu o tenha perdido sem ao menos perceber. Talvez porque eu tanto tenha me ausentado que deixei de fazer falta. Sim, porque ele, mesmo comprometido com outra pessoa, sempre atendeu aos meus chamados. Só não soube entender o quanto eu queria atender aos chamados dele, mas estava enrolada demais nos dogmas de uma relação regida pela igreja católica apostólica romana e manipulada por um machista. Sim, porque eu sou facilmente manipulável. E quando consegui me libertar das amarras mentais dessa relação turbulenta, quando consegui recuperar em mim a mulher que ele gostava, foi tarde demais. "Perdi o interesse" - disse, quando implorei por sinceridade. Um golpe duro demais para eu suportar agora. Não estava preparada e talvez nunca tenha me preparado para um rompimento assim, tão duro e inesperado, sem que ao menos eu tivesse a chance de me desculpar e me explicar pelos meus erros grotescos. Combinamos de sermos amantes um do outro a vida inteira. Eu tinha tanta coisa pra contar, e o que eu faço com os beijos que guardei para dar a ele, como ele merecia? O que eu faço com as páginas e mais páginas dos meus diários em que o nome dele está escrito durante esses nove anos de idas e vindas? O que eu faço com as nossas músicas que se tornaram as minhas preferidas? E eu que nem sabia mais o que era chorar, chorei. De soluçar, de doer. Nem sei mais o que pensar. Vou fumar oitenta cigarros, beber tudo que eu puder, porque eu estou condenada a lembrar eternamente do que fomos e só imaginar o que poderíamos ter sido.