sábado, 8 de junho de 2013

Vida mecânica




O despertador toca todos os dias as 6 horas da manhã. Ela faz força para manter os olhos abertos, empurra ele e sai da cama, cambaleando, procurando os óculos que coloca no rosto antes de acender a luz. Ainda é noite. Lava o rosto e o cheiro de café inunda o apartamento. Sai agasalhada, almoço na bolsa, vai de pé no ônibus para ser a primeira a descer. Encontra a amiga no trem, sorriem e quase esquecem de descer. Trabalha incansavelmente e só vê a rua quando já é noite de novo. Faz o mesmo caminho para voltar, toma um banho quando chega e depois um chimarrão rápido antes de jantar. Não aguenta 2 horas depois do banho e cai no sono. E no outro dia o ritual se repete. É mecânico, não é natural não ver a cor do dia, as vitrines, ler um livro ao menos. Ela parece um robô que todo dia faz tudo igual, pouco vê os amigos e a família, nunca tem dinheiro para sair e fazer o que mais gostava. Na verdade, ela não gosta de mais nada. Perdeu o interesse nas baladas, nas bebidas, barzinhos, shoppings, homens e seus beijos e sexos. Ela não quer fazer nada, só dormir, sempre. Conversa com os outros por obrigação e pouco fala de si mesma, mais ouve e observa. Ela não é mais interessante, não usa batom, não pinta os olhos e nem cuida dos cabelos. Não se olha no espelho. Engordou mais. Desistiu dos tratamentos médicos que vinha fazendo. Quase 30 anos na cara e a vida nesse caos. Ela queria que fosse diferente, mas não tem mais forças. Não tem medo de morrer, mas também não faz diferença; ela não sabe o que quer, mas tem certeza do que NÃO quer. Não quer ser roubada, não quer ficar "aleijada", não quer que morra quem ela ama, não quer ter filhos, não quer namorar nem se apaixonar, não quer... viver, talvez. Porque viver não tem sentido e ela não gosta de não entender as coisas, quer ter tudo sob controle e nunca esteve com as coisas tão descontroladas antes. Ela chora no banho para ninguém ver. Desliga o telefone para não falar com quem quer que seja. Ela odeia acordar, não vê mais saídas. Morreu por dentro e ninguém viu.

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